Banco Central se prepara para o lançamento do Real Digital com integração ao Pix

Killian A.
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No último dia 14 de fevereiro foi realizado o BTG Pactual CEO Conference 2023, que tem como um de seus objetivos promover o debate e o avanço das discussões sobre o cenário econômico e político do Brasil. Durante o evento, o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, afirmou que será iniciado o projeto piloto do Real Digital.

Na mesma oportunidade, Roberto Campos Neto enfatizou que o Real Digital vai ser uma moeda digital emitida pelo Banco Central para o atacado, ou seja, para as empresas. A população terá contato com a CBDC por meio de depósitos tokenizados e convertidos em criptomoedas de valor estável (stable coins) emitidas por bancos e instituições aprovadas pelo Banco Central Brasileiro.

Além disso, uma das principais metas, segundo o presidente do Banco Central, é a integração do Pix com o Open Finance e ambos com o Real Digital, principalmente tendo em vista que a moeda digital deverá começar a circular o mais breve possível.

Real Digital, uma nova forma do Real e inovação dos meios de pagamento

De acordo com o Banco Central, uma das diretrizes para o desenvolvimento de um Real em formato digital é a interoperabilidade entre essa nova forma do Real e os meios de pagamento hoje disponíveis à população. Com isso, além dos novos usos que se imagina para o Real Digital, as formas atuais de uso deverão ser também disponíveis.

Assim, será possível fazer pagamentos em lojas, através do prestador de serviço de pagamentos – banco, IP ou outra instituição que venha a ser autorizada pelo Banco Central para tal finalidade –, ou mesmo através do Pix. Poderá, também, ser realizada a transferência de Reais Digitais para outras pessoas, transformar os Reais Digitais que estarão em custódia de um banco em depósito bancário convencional, sacar os Reais Digitais passando para o formato físico, pagar contas, boletos e impostos. Ou seja, será possível movimentar os Reais Digitais da mesma forma que são movimentados os outros recursos hoje depositados nos bancos.

Para ter acesso ao Real Digital, o usuário final terá uma carteira virtual em custódia de um agente autorizado pelo Banco Central – como um banco ou uma instituição de pagamento. É importante destacar que o Real Digital será uma representação digital do Real físico hoje em circulação. E a política monetária será a base de sustentação de seu valor.

Assim, quando o BC movimenta a liquidez da economia, em sua missão de garantir a estabilidade do valor de compra do Real, a quantidade de reais digitais em circulação será levada em conta. O Real Digital vai compor a medida de agregado monetário de maior liquidez disponível, similar a depósitos bancários e à moeda física que está hoje em poder das pessoas.

Uma diretriz estabelecida para o Real Digital é que ela mantenha os elevados níveis de segurança e privacidade hoje disponíveis nas operações realizadas no sistema bancário e de pagamentos. Além disso, o uso do Real Digital promete ser transparente, com a possibilidade de ser convertido para qualquer outra forma de pagamento atualmente disponível, como depósito bancário convencional ou em real físico, e também poderá ser utilizado para pagamentos do dia a dia.

Desafios para a implantação do Real Digital

O Banco Central acredita que o maior desafio à implantação de um real digital decorre do fato de o sistema de pagamentos brasileiro já ser moderno, com boas soluções implantadas tanto para pagamentos no atacado quanto no varejo. O sistema de pagamentos instantâneos, o Pix, é um sucesso de adesão e tem ajudado a mudar a maneira como pequenos negócios fazem as suas transações.

Assim, o maior desafio é ir além dos serviços que já são prestados à sociedade brasileira e fomentar o desenvolvimento de novas funcionalidades, novos serviços e novas formas de prestação de serviços financeiros. O mercado brasileiro ainda não está completamente pronto para esses novos modelos, mas a transformação digital está se acelerando, e não há como se ter certeza de o quão rápido a demanda por esses novos serviços vai se intensificar.

Por isso, o Banco Central deve estar preparado para desenvolver instrumentos para atender às demandas da sociedade e para garantir a eficácia de suas políticas de estabilidade monetária e financeira, conforme expresso em sua missão. O real digital parece ser a ferramenta ideal para essas tarefas.

Além disso, a questão tecnológica é também muito importante. As tecnologias envolvidas na implantação de moedas digitais de bancos centrais estão amadurecendo rapidamente, mas vários testes ainda serão necessários para estabelecer os níveis de eficiência, segurança e privacidade dessas soluções tecnológicas.

Saiba as principais diferenças entre CBDC e ativos virtuais

Central Bank Digital Currencies (CBDC) e Crypto Assets (chamados de moedas virtuais) não são sinônimos. Pelo contrário, eles são muito diferentes em diversos aspectos. Por exemplo, a natureza dos crypto assets é de ativos. Portanto, eles não têm todas as características fundamentais para serem considerados moeda – que servem como meio de troca, reserva de valor e unidade de conta – e não são emitidas por autoridades monetárias (bancos centrais). Por sua vez, os CBDC são moedas de fato e detêm todas as suas características.

Já as criptomoedas como Bitcoin e Ethereum, apresentam uma grande volatilidade, dificultando seu uso como meio de pagamento. O Real Digital, no entanto, é uma expressão da moeda soberana brasileira, que está sendo desenvolvida para dar suporte a um ambiente seguro onde empreendedores possam inovar e consumidores possam ter acesso às vantagens tecnológicas trazidas por essas novas ferramentas, sem que para isso seja necessário se expor a um ambiente financeiro não regulado.

Por isso, o Real Digital pertencerá a uma nova categoria de moedas digitais, as CBDC – do inglês Central Bank Digital Currencies. O Real Digital não será uma criptomoeda no sentido atual do termo, mas sim uma nova expressão da moeda emitida pela autoridade monetária brasileira, e será garantida pelos mesmos fundamentos e pelas mesmas políticas econômicas que determinam o valor e a estabilidade do Real convencional, emitido em papel-moeda.

Quanto à emissão e ao acesso ao Real Digital, ele será emitido pelo Banco Central – BC, tendo como fundamento a condução da política monetária, que visa garantir a estabilidade do poder de compra do Real. Dessa forma não haverá mineração.

Qualquer pessoa ou empresa que desejar adquirir os Reais em formato digital entregará Reais em formato convencional e o Banco Central emitirá os Reais digitais correspondentes. Essa operação não será feita diretamente com o BC, pois será intermediada por um participante do sistema financeiro – banco, cooperativa ou fintech – ou do sistema de pagamentos – instituição de pagamento – ou ainda de algum novo tipo de empresa que venha a ser criada sob a autorização do BC para intermediar o acesso e a utilização de reais no formato digital.

Por fim, é importante destacar que o foco da iniciativa do Real Digital é para as questões domésticas, mas a discussão internacional sobre pagamentos transfronteiriços tem mostrado força, principalmente com as diretrizes publicadas pelo G20 para a melhora dos sistemas internacionais de pagamentos.

Uma coordenação internacional poderia trazer enormes ganhos de eficiência para esses sistemas e as discussões sobre CBDC, das quais a grande maioria dos bancos centrais têm participado, colaboram para reforçar essa coordenação, de forma que o Banco Central do Brasil não pode se abster dessa discussão.