El Salvador depois do Bitcoin: rejeição de 61,3%.

Augusto Medeiros
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Foto de Esaú González na Unsplash

Como está El Salvador depois do Bitcoin virar moeda oficial? O país surpreendeu o mundo, há pouco mais de um ano, ao se tornar o primeiro a ter uma criptomoeda como moeda nacional.

Enquanto muitas pessoas, em todo o mundo, ainda, acostumam-se com as criptomoedas, o presidente de El Salvador, Nayib Bukele, segue confiante em seu plano de usar o Bitcoin como moeda oficial no país da América Central. Por outro lado, a maioria da população discorda, aponta estudo e o FMI pede cautela.

O inverno cripto traz preocupação porque houve muita perda do investimento do Governo de El Salvador em BTC. É o que você vai ver neste artigo.

El Salvador foi pioneiro no uso do Bitcoin como moeda nacional e serve de laboratório para outros países e o mercado entenderem o futuro da criptomoeda. A questão da volatilidade, inerente às criptomoedas, é um ponto importante para a baixa aceitação da medida econômica, como você verá a seguir.

Pesquisa revela rejeição popular ao Bitcoin

Nayib Bukele – presidente El Salvador (Imagem Internet) 

Os dados levantados pelo Instituto Universitário de Opinião Pública (Iudop) da UCA (Universidade Centro-americana José Simeón Cañas) mostram que maior problema enfrentado por EL Salvador, na visão da população, é a economia. Estudo, também, abordou a questão do Bitcoin.

Segundo o Iudop, 61,3% dos entrevistados reprovam o uso do Bitcoin como moeda oficial, contra 38,7% que aprovam.

Reprodução Iudop – UCA

  

Entre os as pessoas ouvidas, 75,6% disseram não utilizar o Bitcoin para compras ou pagamentos, contra 24,4% que afirmaram usar a moeda digital para esses fins.

Perguntados se o Governo deve seguir gastando o dinheiro público com Bitcoin, 77,1% responderam que não, 14,9% que sim, e 8% disseram que não sabem ou não responderam.

Outra pergunta foi se a aprovação do Bitcoin como moeda oficial foi um erro ou um acerto: 65.5% disseram que foi um fracasso; 16,5% acreditam que foi um êxito; 18% não sabem ou não responderam.

O Instituto Universitário de Opinião Pública (Iudop) da UCA informou que o objetivo de um amplo estudo acadêmico foi conhecer, entre outras coisas, a opinião dos salvadorenhos a respeito da implantação do Bitcoin um ano após a entrada em vigor do Decreto Legislativo nº 57 de 2021 que autorizou esta criptomoeda como moeda legal no país.

A pesquisa foi realizada entre os dias 9 e 27 de setembro de 2022 e divulgada este ano, no mês passado. O instituo explica que a metodologia do estudo de opinião tem uma amostra representativa do total da população adulta residente no país.

A amostra nacional tem um total de 1.269 entrevistas válidas e uma margem de erro de mais ou menos 2,75%; um nível de confiança de 95%. A coleta de informações para este estudo acadêmico foi realizada, presencialmente, com visita direta à residência dos salvadorenhos que concordaram em participar do estudo.

Como está a economia de El Salvador hoje?

Em 25 de janeiro, o Iudop publicou um editorial baseado nos resultados da pesquisa e que traz uma análise sobre a conjuntura econômica e social, atual, em El Salvador. Veja o texto, na íntegra, a seguir:

“Na mais recente pesquisa do Instituto Universitário de Opinião Pública (Iudop), a economia aparece como a maior preocupação da população. E isso não é acidental. A cesta básica ficou significativamente mais cara. Laticínios, feijões, ovos, vegetais e outros alimentos essenciais têm subido mês após mês. situação econômica.

Da mesma forma, as detenções massivas e prolongadas em decorrência do estado de emergência atingiram a economia familiar de um grande número de domicílios. A tudo isto acrescenta-se que tanto o Banco Mundial como o Ministro das Finanças têm dito que 2023 será um ano ainda mais complicado do que 2022.

Nesse contexto, é preocupante a ausência de investimentos do Estado no setor produtivo e o desinteresse do governo por uma reforma tributária progressiva que faça quem tem mais pagar mais.

Continua apostando, sim, no endividamento —que já atinge níveis próximos do inadimplemento—, no Bitcoin e em projetos que beneficiam poucos em vez de favorecer o desenvolvimento do país como um todo (Surf City, por exemplo) ou que apenas buscam gerar expectativas e ilusões de progresso (o trem costeiro e o aeroporto La Unión).

A falta de diálogo sobre os problemas nacionais acrescenta um pessimismo à falta de um plano econômico sério e verificável.

As ansiedades e dificuldades dos cidadãos em torno da economia são sempre uma fonte de desgaste para os governos. Deles costumam surgir protestos, mas também propostas de mudança.

No momento, o governo Bukele parece satisfeito em obter boas notas nas pesquisas, contar com forte apoio dos cidadãos e ter conseguido destruir qualquer oposição política que possa se apresentar como alternativa.

Mas o descontentamento social sobre a situação econômica não se resolve com aplausos. Diálogo com a sociedade civil, não se fechando em abordagens próprias, analisando objetivamente as críticas à gestão do país são tarefas governamentais necessárias para um desenvolvimento equitativo. Sair da auto-referência e do autoritarismo, respeitar os direitos humanos e investir mais nas pessoas tornaria a crise atual mais suportável e beneficiaria o ambiente social e político de El Salvador.”

Títulos lastreados em Bitcoin

Andre Francois Mckenzie (Unplash)

Independentemente da insatisfação da maioria da população, os planos do governo Bukele para o Bitcoin seguem firmes, a mais recente notícia que vem lá da América Central é a aprovação de uma lei que abre caminho para títulos lastreados.

Chamada de “Emissão de ativos digitais”, a lei também prevê a criação de um órgão regulador.

A aprovação pela Assembleia Legislativa foi no mês passado e serve para regular a emissão de ativos digitais, que vão além dos Bitcoins. Isso significa que é possível serem lançados títulos lastreados na criptomoeda. Ou seja, o governo daria o Bitcoin como garantia.

E, em novembro do ano passado, o presidente disse que pretendia levantar US$ 1 bilhão por meio de novos títulos, mas a ideia não avançou dada à crise do setor.

A ideia, agora, é firmar a parceria com a corretora Bitfinex para lançar títulos de Bitcoin em forma de criptomoedas.

Esse valor de US$ 1 bilhão seria para pagar dívidas e financiar a mineração de Bitcoin no país. Por esse motivo, o papel foi chamado de “Volcano Bonds” (títulos de vulcão), porque a mineração usaria a energia renovável produzida graças aos vulcões ativos, no país.

Estímulo para uso do Bitcoin

A preocupação com os investimentos do presidente em Bitcoin é antiga, como publicou o The New York Times, em julho do ano passado, quando as participações do país, em Bitcoin, já haviam perdido 60% de seu valor devido às perdas da moeda, que entrou em queda desde março.

Em 2021, o governo destinou 15% do orçamento anual para estimular o uso do Bitcoin na economia de El Salvador.

Um projeto oferecia US$ 30 a quem baixasse o aplicativo de pagamentos, Chivo Wallet.

Segundo a publicação, Bukele disse que quase 3 milhões de salvadorenhos (a população é de 6,5 milhões) baixaram o aplicativo.

Porém, depois de gastarem os US$ 30, apenas 10% seguiram usando o Chivo Wallet, segundo divulgado pelo Escritório Nacional de Pesquisa Econômica dos EUA.

“O governo deu a esse projeto todo o apoio que se poderia esperar, e ainda assim fracassou”, afirmou Fernando Alvarez, da Universidade de Chicago, um dos economistas responsáveis pelo estudo.

 Por outro lado, há quem defenda que o pioneirismo de El Salvador trouxe oportunidades.

“Na medida em que buscamos liberdade financeira, continuamos no caminho certo”, disse Eric Gravengaard, CEO da Athena Bitcoin

Athena é uma empresa de criptomoedas sediada nos EUA, que opera a rede de caixas eletrônicos de criptomoedas de El Salvador e, também, faz o processamento de transações em Bitcoin para redes varejistas do país.

Segundo o NYT, até o fim do primeiro semestre do ano passado, os negócios de Bukele custaram ao governo cerca de US$ 63 milhões em desvalorização.

“O problema do bitcoin é que ninguém está ganhando nada”, disse Carlos Acevedo, economista salvadorenho e ex-diretor do banco central. “É um investimento que não traz benefícios sociais.”

Em novembro do ano passado, as perdas aumentaram depois do colapso da corretora FTX, que trouxe mais desvalorização para o Bitcoin, chegando a US$ 70 milhões em prejuízos. Mesmo assim, Buleke saiu em defesa da moeda, num post do Twitter, como publicou a exame.

“A FTX é o oposto do protocolo do bitcoin. O bitcoin foi criado justamente para evitar esquemas de pirâmide, corridas bancárias, Enron, WorldCom, Bernie Madoff, Sam Bankman-Fried”, disse o presidente no Twitter, em referência a casos de quebras de empresas e golpes.

El Salvador segue nas compras de Bitcoin

Em novembro do ano passado, o presidente de El Salvador anunciou que iria seguir nas compras do Bitcoin, com a aquisição de uma unidade por dia.

O governo não comprava Bitcoin desde julho de 2022.

De acordo com informações públicas, o país detém 2.381 BTC a um preço médio de compra de US$ 43.357. 

Dessa forma, o governo investiu quase US$ 103,23 milhões em aquisições de bitcoin que agora equivalem a US$ 39,4 milhões.

Em setembro de 2021, quando o governo iniciou os investimentos, o BTC estava na casa dos US$ 46.500 e hoje vale cerca de US$ 24.000.

Interferência do FMI: pedido de cautela

O Fundo Monetário Interacional (FMI) pediu cautela ao governo de El Salvador sobre a compra de Bitcoins. 

O motivo seria a “natureza especulativa” dos mercados de criptomoedas.

O FMI considera que os riscos da criptomoeda não se concretizaram porque o uso, ainda, é limitado, no país.

Funcionários do FMI visitaram o país, recentemente, e publicaram uma declaração com as orientações.