Contra corrupção, governo da Venezuela interrompe operações de mineração cripto no país

Sead Fadilpašić
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Tarek William Saab. Imagem: Ministerio Público venezuelano / Twitter

A força-tarefa do governo venezuelano para acabar com um esquema de corrupção envolvendo o segmento das criptomoedas do país afetou as operações de mineração cripto.

De acordo com postagens no Twitter feitas pela Associação Nacional de Criptoativos da Venezuela, citando uma reportagem da mídia local, as instalações de mineração cripto em Bolívar (um dos 23 estados da Venezuela) foram fechadas nos últimos dias.

A associação reclama:

“Consideramos isto uma medida arbitrária, que vai contra os interesses da indústria privada.”

Bolívar não é o único estado impactado, já que Lara e Carabobo teriam sofrido a mesma ação governamental contra as instalações ali localizadas. Os cortes, dizem outros relatórios, estão ocorrendo em todo o país.

O CEO da empresa privada Doctorminer, Theodoro Toukoumdis, e o CBO Juan José Pinto emitiram uma declaração em 23 de março na qual afirmam que houve “uma ação que afetou a entrega adequada de seus serviços aos clientes de hospedagem internacional por um período de tempo incerto”.

Os executivos da empresa cripto afirmam:

“Após a mudança de administração no regulador criptográfico do governo, Sunacrip, devido a investigações de possível má administração de fundos públicos, o fornecedor nacional de energia (CORPOELEC) está ordenando o fechamento de infraestruturas de hashrate em todo o país enquanto as investigações estão em andamento.”

Eles acrescentaram que não sabiam dizer quanto tempo duraria o “corte de energia mais longo do que o normal”.

Atualmente, não há informações verificadas sobre quantas empresas de mineração cripto foram desligadas. Os informes da mídia local afirmam que as fazendas de mineração licenciadas também foram fechadas.

Essas empresas estariam agora pedindo a reabertura urgente, com o argumento de que a medida está custando os empregos de muitas pessoas e, ao país, os impostos pagos por esses funcionários.

Bolsas cripto estariam sendo obrigadas a interromper atividades

Segundo vários relatórios, pelo menos algumas exchanges foram ordenadas a cessar as operações na Venezuela. A startup Cryptobuyer publicou no Twitter que também teve que fazer isso.

A empresa explicou que interrompeu suas atividades durante o “processo de reestruturação” que o regulador cripto está passando e para “cumprir as ordens emitidas” pela Superintendência Nacional de Criptoativos e Atividades Relacionadas (Sunacrip).

No entanto, apenas um dia depois, a equipe de Cryptobuyer publicou no Twitter:

“Em nenhum momento a Sunacrip ordenou a interrupção das operações como foi deturpado por alguns meios de comunicação. Pelo contrário, [a Sunacrip] deu total apoio para que as bolsas continuassem suas operações.”

A postagem recebeu inúmeros comentários apontando que as duas declarações eram contraditórias e confusas. Em resposta, a empresa direcionou para uma explicação do CEO na seção de “stories” do Instagram (sem fornecer um link). Não foi possível encontrar esse “story”.

A advogada venezuelana Ana Ojeda Caracas também disse que exchanges e empresas de mineração cripto foram ordenadas a cessar as operações, acrescentando que estas medidas são “supostamente temporárias”.

A Sunacrip não emitiu até agora uma declaração para esclarecer a confusão.

De acordo com Decrypt, o presidente da Associação Nacional de Criptomoedas, José Ángel Alvarez, disse que as empresas privadas não podem assumir a responsabilidade pelo que está acontecendo dentro do órgão regulador e que estão preparando uma lista de propostas a serem entregues em breve à Sunacrip.

21 presos em operação do governo venezuelano

O argumento oficial é de tudo isso faz parte da investigação de corrupção que inclui a empresa petrolífera venezuelana PDVSA. Os detalhes ainda não estão bem claros.

Tarek William Saab, procurador-geral da Venezuela, alegou que certos funcionários do governo estavam conduzindo operações petrolíferas com a ajuda do departamento de criptografia da nação. Saab acrescentou:

“10 funcionários e um grupo de 11 empresários foram presos pela suposta participação em uma rede de corrupção na Petróleos de Venezuela (PDVSA).”

Entre os presos estão o vice-presidente de Comércio e Abastecimento da PDVSA, apontado como chefe da estrutura de corrupção, Antonio José Pérez Suárez; e o ex-diretor da Sunacrip e operador cripto financeiro, Joselit de La Trinidad Ramírez Camacho, que já teria atuado como braço-direito do presidente venezuelano Nicolás Maduro.

 “Da mesma forma, Rajiv Alberto Mosqueda e Renny Gerardo Barrientos, ambos pertencentes à Mineração Digital e Processos Associados, aparecem na lista.”

Camacho tinha liderado o departamento de criptografia desde sua criação em 2018, supervisionando as regras fiscais de criptografia e o chamado PetroDollar do país. Ele também faz parte da Lista dos Mais Procurados dos EUA desde junho de 2020.

As autoridades venezuelanas o prenderam em 17 de março. O presidente da Venezuela Nicolás Maduro anunciou a reorganização da Sunacrip nesse mesmo dia. A advogada Anabel Pereira Fernández assumiu a direção da Sunacrip por ordem do governo de Maduro.

Durante discurso logo após as prisões, Maduro disse que US$ 3 milhões foram desviados. O dinheiro seria proveniente da venda de cerca de 120 milhões de barris de petróleo de propriedade do Estado. A venda teria sido feita a um comprador estrangeiro de nome não revelado.

Enquanto isso, Saab afirmou:

“Esta rede utilizou um conglomerado de empresas comerciais para legitimar o capital obtido a partir das vendas através da aquisição de bens pessoais, imobiliários e criptoativos.”

De acordo com Saab, as investigações detectaram uma rede de funcionários usando a posição e autoridade para realizar operações petrolíferas paralelas à PDVSA.

“Isto foi feito pela atribuição à Sunacrip e a indivíduos de cargas de petróleo bruto em navios pela empresa estatal, sem qualquer tipo de controle administrativo ou garantias. Isto não atende aos regulamentos de contratação necessários para este fim.”

Uma vez que este petróleo bruto ilegalmente atribuído foi comercializado, os pagamentos correspondentes à PDVSA não foram cumpridos.

Para estas operações, foi utilizado um conglomerado de empresas comerciais que legitimou o capital obtido nas vendas pela aquisição de criptoativos, bens móveis e imóveis, e investimentos no setor de construção. Eles também demonstraram publicamente um estilo de vida que não corresponde ao de funcionários públicos.

E isto não é tudo, o anúncio sugere. Estas detenções, segundo informações obtidas a partir do inquérito, provavelmente levarão a mais participantes no esquema de fraude.

Saab se recusou a compartilhar quaisquer outros números e valores neste momento.

Você pode assistir ao anúncio completo abaixo (em espanhol, com opção de auto tradução em inglês disponível). 

Sunacrip supervisiona grandes operações com criptoativos

A Sunacrip é o órgão governamental venezuelano responsável em supervisionar a venda de petróleo e outras mercadorias a entidades estrangeiras cujas contas são liquidadas em criptoativos em vez de dólares.

O órgão tem papel importante junto a exportadores venezuelanos, ao oferecer assessoria para evitar as sanções lideradas pelo governo dos Estados Unidos. A política de sanções americanas estaria fazendo Nicolás Maduro acumular um “esconderijo” de criptomoedas, incluindo Bitcoin (BTC) e Ethereum (ETH).

Desde 2018, a Sunacrip supervisiona a aplicação do decreto sobre o Sistema Integral de Criptoativos. Trata-se de uma lei, aprovada pela agora extinta Assembleia Nacional Constituinte da Venezuela, que enquadra legalmente o mercado de criptomoedas naquele país.

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