Alta do dólar – O que explica e o que vem pela frente

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O dólar está novamente em alta. Já no início de abril, o Banco Central fez sua primeira intervenção no novo governo para tentar segurar a alta da moeda americana. No dia 2/04, o BC fez um leilão de swap cambial de US$ 1 bilhão. No entanto, a moeda continuou subindo consideravelmente nas últimas semanas.

Até que, nesta terça-feira (16), a moeda norte-americana atingiu o valor de R$ 5,27. Por outro lado, sofreu uma queda de 0,59% nesta quarta-feira (17), chegando a R$ 5,239. Mas essa leve queda não chega nem perto de compensar o salto recente. Afinal, nos últimos cinco dias úteis, a moeda acumulou elevação de 5,23%.

Aliás, o valor atingido na terça (16) foi o maior em mais de um ano, desde março de 2023, quando chegou a R$ 5,29. Quais são os motivos para essa alta? Segundo especialistas, há principalmente dois motivos externos e dois internos. Vejamos quais são eles.

Economia dos EUA é “tempestade perfeita” para a alta


Segundo a economista-chefe da B.Side Investimentos, Helena Veronese, estamos passando por uma “tempestade perfeita” nos Estados Unidos. Então, há uma expectativa de que a política monetária dos EUA continue apertada por mais tempo.

Por exemplo, a inflação dos preços ao consumidor, a economia aquecida, as falas dos dirigentes do FED e a própria ata da última reunião da instituição. Tudo isso faz o mercado entender que ainda vai demorar até que o banco central americano comece a cortar os juros.

Portanto, os operadores precificam agora cortes de 0,40 ponto percentual dos juros pelo FED este ano. Isso fica bastante abaixo do 1,50 ponto que se esperava no início do ano. Aliás, a taxa de juros dos EUA está entre 5,25% e 5,5%, considerada alta pelos padrões norte-americanos.

Por outro lado, uma taxa de juros mais alta por lá se torna mais atrativa para o investidor. Ou seja, o dólar sobe não apenas no Brasil, mas no mundo todo.

Por fim, é importante lembrar que a rentabilidade nos EUA é preferível, mesmo que a taxa Selic aqui ainda seja muito mais alta (atualmente, está a 10,75% ao ano). Isso porque o investimento na economia dos Estados Unidos tem um risco menor. Como explica Luan Aral, especialista em dólar da Genial Investimentos:

“A gente está falando da taxa mais sólida, mais segura e mais atraente do planeta. Então, o investidor faz essa conta: será que vale mais a pena eu ter uma renda um pouco maior no Brasil, mas correndo risco muito grande, ou ir para os Estados Unidos e absorver esse ganho lá, mas com um risco muito menor?”

Conflito entre Israel e Irã também é fator importante


Além disso, há um fato recente do cenário geopolítico internacional que ajuda a influenciar o preço do dólar. Trata-se do conflito entre Israel e Irã. No último sábado (13), o Irã lançou drones e mísseis em direção a Israel como retaliação ao bombardeio israelense no consulado iraniano na Síria. Esse ataque havia matado líderes militares iranianos.

Em seguida, o primeiro-ministro israelense Benjamin Netanyahu declarou que o país não poupará esforços para se defender. Portanto, com a possível escalada do conflito, surge uma preocupação com a entrada de outras nações no enredo, o que traria ainda mais insegurança ao cenário internacional.

Um contexto geopolítico de crise e repleto de incertezas também é fator para a alta do dólar. Afinal, trata-se da moeda mais segura do mundo, e os cenários de conflitos sempre geram um temor econômico. Portanto, os investidores tendem a colocar seu dinheiro nos investimentos mais seguros. Segundo Veronese:

“É normal que, em um período em que a gente não sabe se Israel vai responder, como vai responder, se isso vai escalar para um conflito maior ou não, o dólar fique mais forte.”

Por fim, ela lembra que isso vale para todo o mundo, e não apenas para o Brasil:

“A gente está falando de dólar no México, dólar na África do Sul, dólar no Canadá, dólar em pares emergentes, dólar em alguns países europeus e assim por diante. Então, esses foram fatores que colocaram o dólar DXY, que é o dólar frente aos principais pares e o dólar também frente aos emergentes [neste patamar] ganhando força com isso.”

Fatores domésticos também contribuem para alta


Além disso, há dois fatores da política e economia brasileira que ajudaram nessa alta, segundo especialistas. São eles o adiamento da regulamentação da reforma tributária e a previsão do orçamento para o ano que vem.

Por exemplo, os projetos de lei para a regulamentação da reforma tributária já deveriam ter sido apresentados, mas foram protelados. Embora pareça um detalhe, esse processo é importante para dar uma ideia de quanto o governo federal poderá arrecadar, explicou Luan Aral. Aliás, o especialista lembra que esse ano legislativo deve ser mais curto por causa das eleições municipais.

Além disso, o mercado não reagiu bem ao Orçamento previsto para o ano que vem. O governo federal entregou nesta segunda-feira (15) o projeto da Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2025 (LDO 2025) para o Congresso Nacional. Porém, o projeto não prevê o superávit de 0,5% que se imaginava, mas sim um déficit zero.

A margem de tolerância é de 0,25 ponto percentual do PIB para mais ou para menos. No entanto, o mercado avaliou que a revisão da meta traz maior insegurança. Além disso, ela também abre espaço para que o governo gaste mais.

Aliás, as metas estabelecidas até então não eram consideradas factíveis pelos especialistas. No entanto, o anúncio da revisão piorou ainda mais a situação. Afinal, segundo Veronese e Aral, não há previsão de volta do superávit.

Segundo Helena Veronese, do lado das receitas o governo já chegou no limite. Por exemplo, ao criar novos impostos e taxar grandes fortunas. Por outro lado, para Luan Aral, o governo não pensou em mexer nos gastos. Portanto, isso pode levar a um efeito cascata que vai culminar no déficit fiscal para 2024 e 2025.

Para Haddad, cenário internacional é o principal vilão


O ministro da Fazenda Fernando Haddad também atribuiu ao cenário turbulento internacional a principal responsabilidade pela alta do dólar. O ministro também citou os dados de atividade dos EUA, como a inflação, e o conflito no Oriente Médio e seu potencial impacto no preço do petróleo:

“Eu estou acompanhando, evidentemente, junto ao Tesouro e ao Banco Central o que está acontecendo. Está havendo uma reprecificação de ativos no mundo inteiro. Hoje, por exemplo, o peso mexicano está sofrendo mais do que o real brasileiro. Indonésia também.”

Aliás, Haddad está em Washington (EUA) para participar de encontros do FMI, Banco Mundial e G20. Ele foi entrevistado por repórteres nesta terça-feira (16), e afirmou que:

“Tem muita coisa que está fazendo com que o mundo esteja atento ao que está acontecendo nos Estados Unidos e o dólar está se valorizando frente às demais moedas. Eu diria que isso não explica tudo o que está acontecendo no Brasil, mas explica dois terços do que está acontecendo no Brasil.”

Haddad caracterizou o momento que o país passa como uma “turbulência semanal”. Além disso, o ministro também lembrou que, no governo do presidente Bolsonaro, o dólar chegou ao valor de R$ 6, e que os juros dispararam. No entanto, ele lembra que “essas coisas se acomodam depois”.

O ministro também caracterizou o momento como “tenso”, e afirmou que o “lado externo não está ajudando”. Por outro lado, ele acredita que está tentando corrigir o “lado interno”, através do “diálogo no Executivo, no Legislativo”. Por fim, ele também pediu, nessa situação mais delicada, um momento para “repensar a estratégia e redefinir o papel de cada um para reestabilizar as expectativas”.

Haddad justifica revisão da meta fiscal


Haddad pede apoio da Febraban a projetos no Congresso
Fernando Haddad, ministro da Fazenda. Imagem – Agência Brasil/EBC

Além disso, o ministro foi questionado se o terço que resta para explicar a alta do dólar no Brasil poderia ser atribuído à revisão da meta fiscal. Haddad respondeu que é preciso “explicar melhor” o que vai acontecer com as contas públicas brasileiras.

O ministro explicou que a LDO 2025 foi apresentada pensando em uma trajetória mais consistente do que a anunciada ano passado:

“Nós estabelecemos uma trajetória que é consistente com o equilíbrio da dívida pública, mas factível à luz dos movimentos do Congresso Nacional nesses 15 meses, quase 16 meses que nós estamos à frente do governo. Sopesando as forças que estão envolvidas para nós passarmos para a sociedade, para os investidores, uma trajetória que parece mais consistente do que aquela que foi anunciada em março do ano passado.”

Por fim, o ministro afirmou que era desejo do governo “antecipar o quanto antes o equilíbrio fiscal”. No entanto, ele lembra que “estamos numa democracia e nós estamos negociando as medidas com o Congresso”.

Haddad não citou explicitamente as recentes derrotas do governo no Legislativo. No entanto, afirmou que a Fazenda precisa “negociar todas as medidas, caso a caso e, em geral, com perdas”. Segundo ele, a Fazenda sempre “acaba ficando desfalcada de algum pedaço que era importante para o fechamento das contas”.

É difícil afirmar o que vai acontecer a seguir


Apesar dessa nova alta do dólar, o Banco Central do Brasil não tomou nenhuma atitude. O BC ficou apenas observando os negócios, sem realizar leilões extras de swap cambial, como no início do mês. Também não colocou dólares à venda com compromisso de recompra.

Aliás, essas foram ações que a instituição já adotou para reduzir a volatilidade. No entanto, alguns profissionais acham que o atual cenário já justificaria uma atuação do BC. Por exemplo, o especialista em câmbio da One Investimentos, Matheu Massote, comentou que: 

“Acho que era o momento sim de fazer algo para conter a volatilidade, principalmente porque não vejo fundamentos claros para o dólar estar no atual patamar.”

No entanto, Massote reconhece que “a gestão do Roberto Campos Neto no BC nunca foi intervencionista e sempre demonstrou cautela antes de atuar no câmbio”.

Por outro lado, para Cleber Alessie Machado, gerente da mesa de Derivativos Financeiros da Commcor DTVM, a intervenção do BC não é interessante porque o dólar não está subindo apenas no Brasil, mas no mundo todo. Portanto, segundo ele, uma estratégia de vender dólares seria, na prática, como “enxugar gelo”. Afinal, o movimento de alta é global e não apenas nacional.

Por fim, vários especialistas pontuam que o ambiente nebuloso atual dificulta saber em quais níveis o dólar vai se estabilizar. No entanto, segundo eles, um cenário de cotações mais próximas aos R$ 5 parece improvável.

Não é momento para pânico, diz economista


Para a economista-chefe da B.Side, Helena Veronese, não é momento de adotar uma postura de pânico. Afinal, a guerra não vai se resolver no curto prazo. No entanto, poderemos saber no curto prazo se Israel vai responder ou não. Além disso, ela pondera que:

“O aspecto fiscal já estava um pouco no preço da moeda, e vamos ver como é que vão ser as sinalizações nas próximas semanas. A meta de 2024, por exemplo, não foi mudada. Eu acho que o Fed é o que mais vai pressionar esse dólar para cima, então eu não acho que é hora de sair comprando o dólar loucamente.”

Por outro lado, o especialista em dólar da Genial Investimentos, Luan Aral, acredita que alguns indicadores internos mostram um cenário de estabilidade. Por exemplo, a última edição do Boletim Focus prevê o dólar encerrando o ano cotado a R$ 4,97. Aliás, uma leve alta em relação ao relatório das semanas anteriores, que projetavam R$ 4,95.

Por fim, Aral elenca alguns fatores que apontam para um dólar mais baixo do que atualmente. Por exemplo, a inflação sob controle, a reserva de dólar estável e o fato de o Banco Central estar cumprindo o seu papel. No entanto, ele lembra que esse ano ainda terá um período conturbado com as eleições municipais.

Uma dica para quem for viajar


Os valores do dólar que são divulgados e foram citados nesta matéria são do dólar comercial. Ele é usado nas transações e negociações essencialmente comerciais.

Por outro lado, para quem for viajar e tem que comprar a moeda nas corretoras de câmbio, a referência é o dólar turismo. No entanto, esse está num valor mais alto, cotado, nesta quarta-feira (16) a R$ 5,302.

Portanto, para quem for viajar, Aral sugere fazer compras recorrentes:

“O que eu sugiro para quem quer montar uma reserva de dólar, para quem está querendo viajar para o exterior, é que faça compras recorrentes, por exemplo, a cada 15 dias compre uma pequena quantidade. Então, por exemplo, se você precisa de 10 mil dólares para viajar para o exterior, e você tem até o final do ano, divida esses 10 mil dólares no tempo que você tem até a viagem. O pior cenário que pode acontecer é você ter um preço médio da sua compra de dólar, muito próximo de onde está o mercado.”

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