Exclusivo – Uma conversa sobre startups de impacto social com Marcelo Homrich, da Halcyon

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Imagem: @_notWillyWonka

As startups voltadas ao impacto social e à sustentabilidade têm crescido nos últimos anos. Afinal, há uma conscientização crescente a respeito dos efeitos da crise climática e da ação do homem sobre o planeta.

Os investidores têm buscado iniciativas que tragam inovações nesse sentido. Elas precisam ser capazes de transformar positivamente a nossa relação com a natureza e fortalecer comunidades que se encontram fragilizadas atualmente.

No entanto, essas iniciativas também devem se mostrar viáveis economicamente. Por isso, trata-se de um desafio grande. As empresas que surgem nesse sistema procuram subverter os modos de produção e distribuição tradicionais, mas ao mesmo tempo gerar lucro.

Na esteira da Conferência do Clima das Organizações das Nações Unidas (ONU), a COP 28, novos projetos devem surgir em todo o mundo. E a América Latina, incluindo o Brasil, pode ser um berço fértil de ideias nesse mercado.

Sobre Marcelo Homrich


Para entender melhor esse cenário, conversamos com Marcelo Homrich, diretor da incubadora americana Halcyon. A empresa, com sede em Washington, é especializada em startups de impacto social. Já apoiou projetos em diversas partes do mundo, com um olhar atento para o sul global.

Na Halcyon, Marcelo participa da criação e da implementação de programas de apoio a novas empresas com viés social. Anteriormente, ele teve experiências com programas de aceleração e incubadoras no Brasil, ajudando a desenvolver novos negócios com uso intensivo de conhecimento.

Marcelo tem bacharelado e mestrado em Administração de Empresas pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Também possui um bacharelado em Comunicação e um MBA em Marketing pela Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM).

Cryptonews Brasil – Houve um crescimento recorde no mercado de investimentos em startups de impacto social no último ano. Você nota uma mudança nas percepções dos investidores em relação a projetos voltados à sustentabilidade?

Marcelo Homrich – Os valores ultrapassaram a marca de US$ 1 trilhão no ano passado, com o apoio de uma ampla gama de investidores, incluindo fundos de venture capital, investidores anjos e fundações. Sim, notamos que há uma maior consciência por parte dos investidores, principalmente, sobre a crise climática que estamos vivendo e, consequentemente, uma mudança com relação à viabilidade financeira dos investimentos sustentáveis.

Considerando as novas tecnologias climáticas, onde está o maior potencial para impulsionar o surgimento de startups de impacto social?

Nosso foco, a partir de um programa direcionado para startups de impacto social, é alicerçado em três pilares, sendo um deles o clima, ou seja, tecnologias que possam contribuir para um futuro sustentável. Neste sentido, nos interessam soluções em energia renovável, construções verdes, dados climáticos, agricultura, WaterTech e economia azul, entre outras tecnologias ligadas ao pilar do clima.

Startups de impacto social na América Latina

Qual a importância da América Latina nesse cenário de aumento dos investimentos em startups voltadas à sustentabilidade?

A América Latina tem uma importância estratégica no atual cenário que estamos projetando para impulsionar e oferecer oportunidades para startups de impacto social. Tanto que possuímos um programa específico para startups da região. Existe um potencial na região e temos percebido a qualidade das soluções apresentadas em eventos recentes que realizamos.

O Sul Global é o mais afetado pela mudança climática e também a região com o maior potencial para desenvolver soluções, principalmente por conta da sua riqueza natural.

O próximo programa acontecerá a partir de julho e as inscrições já estão abertas. As startups interessadas em participar podem se inscrever até 22 de março diretamente no site da incubadora: www.halcyonhouse.org ou pelo link: https://halcyon.submittable.com/submit.

Quais são os principais desafios enfrentados pelas startups de impacto social na América Latina?

Creio que o cenário exige um foco de longo prazo para startups lideradas por impacto, aproveitando o crescente número de investidores comprometidos com princípios de investimento responsável. E esse é o nosso papel para que as startups tenham uma estratégia na hora de garantir um financiamento como foco na rentabilidade, entre outros princípios importantes.

Como as incubadoras de startups podem ajudar nisso?

Pesquisas mostram que o que faz uma startup falhar é a falta de dinheiro, produto e mercado não alinhados ou time/rede despreparados. Na Halcyon, as startups que participam dos nossos programas, têm acesso aos investidores de impacto da nossa rede de parceiros, networking e treinamento especializado focado em três pilares: prontidão para investimento, liderança e adequação do produto ao mercado. Ou seja, uma verdadeira imersão com curadoria de profissionais especializados para que possam desenvolver suas ideias com assertividade na busca por investimentos.

Parcerias e financiamento

Qual o papel dos recursos públicos para o financiamento de startups de impacto social na América Latina, e em especial no Brasil?

No Brasil, apesar de ainda ter um mercado emergente de investimento de impacto comparado com outras regiões, percebemos que há um desenvolvimento com o surgimento de novos investidores locais e o fortalecimento do diálogo entre mercado, governo e sociedade civil.

No Rio Grande do Sul, por exemplo, onde eu nasci e acompanhei de perto o desenvolvimento do ecossistema de inovação, trabalhando em projetos como o Zenit – Parque Científico e Tecnológico da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), em Porto Alegre, existem várias frentes de financiamentos que passam pelas iniciativas públicas e privadas, como o Programa Inova RS, que investe em programas de aceleração de startups.

Bancos de desenvolvimento têm um papel importante no financiamento público, atuando diretamente com startups ou através de programas geridos por outras aceleradoras, por exemplo, e apoiando governos nas suas iniciativas. O Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul (BRDE) é um exemplo na região Sul, e o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) é o principal exemplo na América Latina e Caribe, inclusive com o seu braço de inovação e venture capital, o BID Lab.

As universidades também têm um peso importante com parques tecnológicos que incentivam e apoiam novos talentos. Acredito que a união de forças para somar e não dividir tem impacto positivo para os resultados obtidos no Sul.

As tendências do mercado

Quais tendências você vê como mais promissoras para o cenário das startups de impacto social no Brasil e na América Latina?

Primeiramente, as tecnologias verdes estão ganhando espaço, com startups focadas em energias renováveis, gestão de resíduos e agricultura sustentável, respondendo à urgência das mudanças climáticas e à necessidade de práticas mais sustentáveis. Posso citar alguns exemplos de startups que passaram por nosso programa de bolsas recentemente para ilustrar.

No Brasil, a startup Bioplix desenvolveu um revestimento biodegradável e atóxico que protege alimentos contra fungos, bactérias, vírus e insetos, ampliando o seu tempo de duração e, consequentemente, reduzindo o desperdício e as consequências relacionadas ao descarte, pois sabemos que os lixões são grandes produtores de gás metano.

Na mesma linha, a Sylvarum, startup da Argentina, focou na economia de água na agricultura, utilizando um processo de eletroestimulação de plantas para um crescimento mais rápido e eficiente.

Além disso, a inclusão financeira emerge como um campo vital, com o desenvolvimento de soluções fintech que visam expandir o acesso a serviços financeiros para populações tradicionalmente não bancarizadas ou sub-bancarizadas, promovendo a inclusão econômica.

Paralelamente, a área de edtech está em ascensão, com startups que utilizam tecnologias educacionais para democratizar o acesso à educação de qualidade, especialmente em regiões remotas ou para comunidades desfavorecidas.

A saúde digital também se destaca, especialmente após a pandemia, que acelerou a adoção da telemedicina e outras soluções digitais para melhorar o acesso e a qualidade dos serviços de saúde, um desafio crônico na região.

Essas tendências não apenas indicam áreas de oportunidade para empreendedores sociais, mas também estão alinhadas com os objetivos de organizações como a Halcyon, que busca apoiar negócios que integram impacto social e rentabilidade. O cenário é promissor para startups que buscam harmonizar inovação, impacto e sustentabilidade na região.

Estratégias para uma transformação real

Quais são as estratégias de longo prazo necessárias para essas startups garantirem financiamento e rentabilidade?

Na Halcyon, acreditamos que para startups de impacto garantirem financiamento e rentabilidade a longo prazo é crucial desenvolver um modelo de negócio sustentável.

Eu enfatizo a importância de medir e comunicar o impacto social claramente, o que não só atrai investidores focados em impacto, mas também fortalece a marca. A construção de relacionamentos sólidos com investidores, clientes e parceiros é fundamental, assim como a adaptação contínua às mudanças do mercado.

Na minha experiência, a inovação e a adaptação são essenciais para atender às necessidades em evolução dos diversos stakeholders. Manter a transparência e comunicar os sucessos e desafios ajuda a construir confiança.

Além disso, um profundo entendimento das necessidades dos clientes permite a criação de soluções valiosas, garantindo a sustentabilidade do negócio. Na Halcyon, apoiamos nossos empreendedores a incorporar essas estratégias, ajudando-os a construir empreendimentos onde o impacto social e a rentabilidade andam de mãos dadas.

Quais dicas você daria para empreendedores com foco em sustentabilidade?

Para empreendedores focados em sustentabilidade, minha principal dica é se dedicar a entender profundamente os desafios ambientais e sociais que pretendem resolver, garantindo que suas soluções sejam não apenas inovadoras, mas também viáveis e impactantes a longo prazo.

A sustentabilidade deve estar no cerne do modelo de negócio, e não apenas como um adicional. É essencial medir e comunicar o impacto de suas ações de forma transparente, o que não só aumenta a credibilidade, mas também atrai investidores e clientes alinhados com valores sustentáveis. Além disso, encontrar os parceiros certos é fundamental para ampliar seu impacto e alcançar a sustentabilidade desejada. Programas de incubação e aceleração são cruciais nesse sentido. Eles fornecem acesso a mentoria, redes de contato e recursos, todos essenciais para o crescimento de startups de impacto.

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