De fundador a réu: a jornada controversa de Sam Bankman-Fried e o fracasso da FTX

Pedro Augusto
| 7 min read

Sam Bankman-Fried, fundador da exchange de criptomoedas FTX, foi considerado culpado por fraude e lavagem de dinheiro. Esta condenação ameaça prender o antigo magnata das criptomoedas por muitos anos. E fortalece os esforços das autoridades dos EUA para regular o setor cripto.

O júri, composto por nove mulheres e três homens, chegou ao seu veredicto após menos de cinco horas de deliberação. Eles encontraram Bankman-Fried culpado em todas as sete acusações. Isso inclui fraude eletrônica contra clientes da FTX e conspiração para cometer fraude de valores mobiliários e lavagem de dinheiro.

No tribunal federal de Manhattan, que estava lotado, Bankman-Fried permaneceu imóvel, de frente para o júri, com pouca ou nenhuma expressão emocional, durante o anúncio do veredicto. Seus pais, Joe Bankman e Barbara Fried, foram vistos se abraçando e baixando suas cabeças em desespero na galeria pública.

Sentença de Bankman-Fried sai no dia 28 de março


Após o veredicto, o advogado dos EUA, Damian Williams, comentou que as ações fraudulentas de Bankman-Fried tinham a intenção de posicioná-lo como um “rei das criptomoedas”. Williams destacou que, embora o setor de criptomoedas possa ser relativamente novo, este tipo de corrupção é “tão velho quanto andar para frente”.

Mark Cohen, advogado de Bankman-Fried, expressou respeito pela decisão do júri, mas também decepção.

“O Sr. Bankman-Fried mantém sua inocência e continuará a lutar vigorosamente contra as acusações”, disse Cohen.

Bankman-Fried planeja recorrer do veredicto. A sentença sai em 28 de março. Este veredicto chega quase um ano após a falência da FTX. E marca a conclusão do julgamento mais relevante do universo das criptomoedas, até o momento.

Quando o júri saiu da sala do tribunal, os pais de Bankman-Fried, ambos professores de direito na Universidade de Stanford, moveram-se para a primeira fila para ficarem mais próximos dele.

Julgamento de Bankman-Fried traz lembranças do caso Madoff de 2009


O julgamento atraiu imensa atenção e lembrou o caso de 2009 contra Bernard Madoff. O esquema Ponzi (pirâmide) de Madoff, que durou décadas, fraudou investidores em aproximadamente US$ 20 bilhões. Ele admitiu a culpa e recebeu uma sentença de 150 anos. Madoff morreu na prisão em 2021.

Aos 31 anos, o julgamento de Bankman-Fried colocou o emergente setor de criptomoedas em foco. Concentrou-se especialmente em um grupo de jovens executivos na casa dos 20 anos. Esses indivíduos moravam juntos em um apartamento de luxo de US$ 30 milhões nas Bahamas e planejavam dominar este novo setor.

A acusação destacou o contraste entre a aparência do réu no tribunal — cabelo curto e terno — e seu visual de costume — cabelo bagunçado e shorts. Esse foi um movimento proposital para diferenciar o homem visto no tribunal daquele que se tornou conhecido por sua aparência casual após a criação do seu fundo de hedge de criptomoedas.

A Alameda Research surgiu em 2017. Já a exchange de criptomoedas, a FTX, dois anos depois.

Pessoas próximas a Bankman-Fried, inclusive sua ex-namorada, foram testemunhas decisivas


Em resumo, a acusação no caso contra Bankman-Fried baseou-se fortemente nos depoimentos de três ex-associados próximos. Entre eles, sua ex-namorada Caroline Ellison. Os três fizeram parte do círculo de alto-escalão de sua empresa.

Ellison, com outros dois executivos, revelou como Bankman-Fried desviou bilhões de contas de clientes da FTX via Alameda Research. De acordo com os promotores, Bankman-Fried, graduado pelo MIT, utilizou os fundos desviados para acumular influência e poder.

Suas ações incluíram doações políticas substanciais, depoimentos ao Congresso e uma campanha de publicidade de alto perfil com personalidades famosas. Por exemplo, entre as celebridades estavam o comediante Larry David e o quarterback Tom Brady.

Ellison, de 28 anos, que foi CEO da Alameda Research, testemunhou com emoção. Disse que, sob a direção de Bankman-Fried, ela se envolveu em atividades fraudulentas. Em resumo, contou como ele tinha ambições de gerenciar grandes empresas, exercer influência por meio de gastos, além de dizer que possuía “5% de chance se tornar presidente dos EUA”.

Depoimentos não tão amigáveis

Em suma, Ellison descreveu a queda do império de criptomoedas em novembro do ano passado, que levou os clientes a exigirem dinheiro de volta e expôs a fraude, como um momento de “alívio”. Isso porque ela não precisaria mais continuar com toda a enganação.

Gary Wang, cofundador da FTX e ex-diretor de tecnologia, revelou em seu depoimento que, a pedido de Bankman-Fried, manipulou o sistema da FTX. Com isto, permitiu que a Alameda Research realizasse saques ilimitados. E tivesse acesso a uma linha de crédito de até US$ 65 bilhões, com fundos essencialmente provenientes dos clientes.

Nishad Singh, ex-chefe de engenharia da FTX, expressou se sentir “surpreso e horrorizado” com a magnitude da fraude cometida por alguém que admirava muito. Ele compartilhou que o colapso em novembro o levou ao limite do suicídio.

Todos os três ex-executivos — Ellison, Wang e Singh — admitiram culpa nas acusações de fraude. Seus depoimentos contra Bankman-Fried foram dados na esperança de receberem clemência durante a sentença.

A jornada de Bankman-Fried — das Bahamas à prisão nos EUA


A prisão de Bankman-Fried ocorreu em dezembro do ano passado, nas Bahamas. Em seguida, ele foi extraditado para os Estados Unidos. Onde conseguiu liberdade provisoria, sob fiança de reconhecimento pessoal de US$ 250 milhões.

Esta fiança incluía condições como monitoramento eletrônico e a exigência de que ele permanecesse na casa de seus pais em Palo Alto, Califórnia.

As diversas comunicações de Bankman-Fried, incluindo inúmeras ligações telefônicas com jornalistas e influenciadores da internet, bem como seus e-mails e mensagens de texto, o complicaram ainda mais. O juiz, após concluir que ele tentou influenciar potenciais testemunhas para seu julgamento, ordenou sua prisão em agosto.

Durante o julgamento, a acusação destacou as próprias declarações públicas de Bankman-Fried, suas postagens online e seu depoimento perante o Congresso.

Eles apontaram como ele garantiu aos clientes, de forma regular, a segurança de seus depósitos. Inclusive em um tweet em 7 de novembro, no qual afirmou, “a FTX está bem. Os ativos estão bem”, enquanto os clientes tentavam desesperadamente sacar seus fundos.

Bankman-Fried deletou o tweet no dia seguinte. Apenas quatro dias depois, a FTX declarou falência.

O escândalo da FTX — como Sam Bankman-Fried desviou fundos e provocou a falência


Sam Bankman-Fried fundou a FTX devido à sua insatisfação com outras exchanges enquanto administrava sua empresa de negociação de criptomoedas Alameda Research.

Isto foi detalhado em um perfil feito pela Sequoia Capital, uma das investidoras da FTX. No entanto, a Comissão de Valores Mobiliários dos Estados Unidos (SEC) acusou a FTX de ser fraudulenta desde o seu início.

A acusação detalhada contra Bankman-Fried o acusou de mau uso e desvio de fundos dos clientes da FTX.

Apesar de promover a FTX e sua afiliada FTX.US como plataformas seguras para investimento em criptomoedas, a acusação destaca que a FTX sofreu com um déficit de vários bilhões de dólares devido ao desvio de fundos dos clientes feito por Bankman-Fried.

Balanço patrimonial da Alameda Research mostrava conexão duvidosa com a FTX

Alega-se que esses fundos foram usados ​​para diversos fins, incluindo fazer investimentos no valor de bilhões de dólares, comprar imóveis avaliados em US$ 200 milhões e quitar dívidas da Alameda Research.

A operação foi exposta quando a CoinDesk publicou um relatório investigativo sobre o balanço patrimonial da Alameda. Ele revelava uma estreita conexão entre a FTX e a Alameda e mostrava que uma parte significativa do balanço era composta pelo token FTT, emitido pela FTX.

Esse relatório levou Changpeng “CZ” Zhao, CEO da Binance e ex-investidor da FTX, a anunciar sua intenção de vender suas participações em FTT.

As consequências dessa revelação foram rápidas, com a FTX declarando falência e Bankman-Fried renunciando ao seu cargo na empresa.

Exatamente um ano após o relatório da CoinDesk, um júri de Nova York considerou Bankman-Fried culpado de todas as acusações feitas contra ele.

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