Banco Central pagará R$ 58 mil reais a professor de economia do MIT para dar palestra sobre criptomoedas

Gabriel Gomes
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Participarão da I Conferência Anual do Banco Central do Brasil profissionais conceituados pertencentes ao setor privado, a bancos centrais, a instituições internacionais ou a universidades. Entre os palestrantes, podem ser citados Robert Townsend, professor do MIT, e Gita Gopinath, Primeira Subdiretora-Geral do Fundo Monetário Internacional. 

Além disso, conduzirão painéis Amir Sufi, professor da Universidade de Chicago, Stijn Claessens, Chefe do Departamento de Política de Estabilidade Financeira do Banco de Compensações Internacionais e Sabine Mauderer, membro do Conselho Executivo do Deutsche Bundesbank, o banco central da Alemanha.

Moedas digitais de bancos centrais estão cada vez mais em alta

Como tem sido divulgado nos últimos meses, o Banco Central está trabalhando em uma CBDC (do inglês central bank digital currency, ou seja, moeda digital de banco central), o Real Digital, cuja fase de testes iniciou-se no dia 6 deste mês.

Prevê-se que o ativo digital, cujo foco será servir às empresas como meio de pagamento, estará disponível para uso disseminado no ano que vem. O atual presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, é um entusiasta da introdução dele.

Uma CBDC é uma extensão digital da moeda de um país, emitida e administrada por seu banco central, ou seja, é uma moeda digital estatal. Vários bancos centrais estudam a ideia. Em alguns países, além do Brasil, testes já foram iniciados. Um exemplo é a China, que está testando o Yuan Digital, uma versão digital de sua moeda, em algumas províncias.

Em 2019, ao site Quartz, que trata de negócios e tecnologia, Vili Lehdonvirta, pesquisadora de Oxford, afirmou que CDBCs podem apresentar vantagens do ponto de vista dos bancos centrais, como permitir-lhes influenciar mais diretamente a economia através do controle do suprimento da moeda e permitir um controle maior dos fluxos de moeda, o que aumenta as chances de detecção de crimes financeiros como a lavagem de dinheiro.

Também é conhecido o fato de que, no mundo todo, os reguladores financeiros, inclusive bancos centrais, veem-se às voltas com a questão de como regular e supervisionar o setor cripto sem deixar que seus excessos prejudiquem a economia e os investidores. 

Além disso, é importante não sufocar o dinamismo da iniciativa privada na criação de soluções que facilitem a vida de consumidores, empreendedores e investidores. Os recentes fechamentos de bancos ligados às criptomoedas colocaram em relevo as dificuldades e a importância do adequado tratamento desses ativos.

No Brasil, provavelmente, o Banco Central terá que assumir parte da supervisão do mercado cripto assim que forem delimitadas por decreto as esferas de responsabilidade da aplicação do marco regulatório das criptomoedas, sancionado no ano passado, o qual deve entrar em vigor neste ano.

Conferência Anual do Banco Central deve servir para discutir soluções

É bastante provável que haja discussões, palestras e apresentações relevantes para o experimento brasileiro e para a regulação do setor cripto de modo geral na I Conferência Anual do Banco Central do Brasil, evento que acontecerá nos dia 17, 18 e 19 de maio e será precedido, no dia 16 daquele mês, por um workshop.

O evento resulta da unificação de dois outros, que, como seus nomes indicavam, também tinham periodicidade anual: o Seminário Anual de Estabilidade Financeira e Economia Bancária e o Seminário Anual de Metas para a Inflação.

Nos dois últimos dias do evento, serão apresentados trabalhos acadêmicos, inclusive de estudantes de pós-graduação. Na edição do dia 13 de março do Diário Oficial da União, foram publicados extratos de inexigibilidade de licitação relativos aos gastos previstos com a contratação de três pessoas para participação na I Conferência Anual do Banco Central do Brasil. 

Em cada um dos casos, a base legal invocada é a mesma: “art. 25, inciso II, c/c art. 13, inciso VI, da Lei n.º 8.666, de 21 de junho de 1993” bem como é a mesma a justificativa da inexigibilidade de licitação: tratar-se de “serviço técnico de natureza singular realizado por profissional de notória especialização”. Segundo os extratos, os três profissionais detêm doutorado.

Para a contratação do professor Townsend para proferir palestra no evento e participar do workshop do dia 16 de maio, intitulado “A tokenização das finanças: dos criptoativos às moedas digitais de bancos centrais”, prevê-se despesa de R$ 58 mil reais. Para a contratação de Sabine Mauderer para proferir palestra no evento, prevê-se despesa de R$ 30 mil reais. No caso da contratação de Amir Sufi para proferir palestra, a despesa prevista é US$ 63 mil dólares.

As inexigibilidades de licitação foram ratificadas pelo Chefe Adjunto do Departamento de Estudos e Pesquisas do Banco Central, Sérgio Mikio Koyama, que as assinou em 9 de março.

Um pouco mais sobre os palestrantes 

Robert Townsend

Robert Townsend escreveu Distributed Ledgers Design and Regulation of Financial Infrastructure and Payment Systems, livro publicado pela editora do MIT. Na obra ele fez uma análise econômica das características e possibilidades dos registros distribuídos e apresentou as bases para o desenho e a regulação dos sistemas financeiros de modo a otimizar os benefícios dela. 

O acesso à obra no formato PDF pode ser feito, de forma gratuita, no endereço https://direct.mit.edu/books/book/4932/Distributed-LedgersDesign-and-Regulation-of.

Em 1998, Townsend ganhou a Medalha Frisch, conferida pela Econometric Society a cada dois anos, por trabalhos em pesquisa aplicada publicados na revista Econometrica nos cinco anos precedentes. O trabalho que lhe valeu essa distinção foi o “Risk and Insurance in Village India”.

Amir Sufi

Amir Sufi é professor de Economia e Política Pública na Escola Booth de Administração da Universidade de Chicago e pesquisador do National Bureau of Economic Research (o nome pode ser traduzido como Departamento Nacional de Pesquisa Econômica), organização sem fins lucrativos. Seu trabalho tem foco em Macroeconomia e Finanças.

Em 2017, Sufi recebeu o Prêmio Fischer Black, concedido a cada 2 anos pela Associação Americana de Finanças, ao principal pesquisador de economia financeira com menos de 40 anos. Ele também é um dos editores do The Journal of Finance, Associação Americana de Finanças, e da American Economic Review, da Associação Americana de Economia.

Sabine Mauderer

Além de ser membro do Conselho Executivo do Deutsche Bundesbank, Sabine Mauderer exerce várias outras funções, entre as quais a de membro da Comissão de Especialistas em Mercado de Capitais do Ministério Federal das Finanças da Alemanha e Vice-Presidente da Network for Greening the Financial System (algo como Rede para Ecologizar o Sistema Financeiro).

Ela já ocupou um cargo na embaixada da Alemanha em Washington e trabalhou no banco de desenvolvimento alemão KfW Bankengruppe, um dos três maiores bancos do país europeu. Entre as muitas atividades em que a instituição financeira está envolvida, encontra-se o apoio às exportações alemãs e projetos de ajuda a pequenas e médias empresas nos países em desenvolvimento.

Bancos privados também demonstram interesse no real digital

A iniciativa privada também está dando passos para se preparar para a chegada do Real Digital e, dentro do possível, influenciar seu formato final. Há cinco anos, a Febraban coordena grupos de trabalho que tratam do uso do blockchain no sistema financeiro e, desde o ano passado, avalia diferentes usos para o Real Digital.

No dia 14 de março, a Febraban, Federação Brasileira de Bancos, anunciou a formação de um grupo de trabalho que colaborará com o Banco Central no desenvolvimento do piloto do Real Digital, por exemplo, tratando de sua capacidade de uso em escala, sua segurança e sua interoperabilidade. Do citado grupo de trabalho, farão parte representantes de 15 bancos.

Em nota, o diretor-executivo de Inovação, Produtos e Serviços Bancários da Federação Brasileira de Bancos, Leandro Vilain, afirmou que a tokenização da economia, processo de que o Real Digital é um dos aspectos, trará ao sistema financeiro grande inovação e abrirá aos bancos oportunidades para que criem e disponibilizem aos clientes novos produtos e serviços.

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