Reforma tributária aprovada no Senado – Uma explicação detalhada sobre o que muda

Pedro Augusto
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O avanço da reforma tributária prosseguiu com sua aprovação no Senado, na quarta-feira, 8 de novembro. Em resumo, a proposta visa a simplificação e unificação dos impostos sobre consumo.

Agora, o projeto retorna à Câmara dos Deputados para nova deliberação, podendo ser votado como um todo ou em partes. As seções da proposta que não sofreram alterações podem ser promulgadas diretamente pelo presidente da Câmara, Arthur Lira. No entanto, as demais serão tema de discursão em votações futuras.

Sob pressão dos governadores do Sul e Sudeste e após negociações de última hora, foram feitas adaptações no projeto. Por exemplo, com a concessão de reduções tributárias a certos setores para 40% da alíquota normal. Em outros casos, alocando sob regimes tributários especiais.

Além disso, um fundo previamente exclusivo para o desenvolvimento do Amazonas se amplia para beneficiar outros estados da Região Norte.

Concessões e travas para a reforma tributária


Concessões adicionais foram feitas durante a votação na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). Essa votação ocorreu na terça-feira, 7 de novembro e atendeu a demandas de clubes de futebol, taxistas e governadores do Centro-Oeste.

Entretanto, as alterações mais significativas já haviam sido divulgadas pelo relator da reforma no Senado, Eduardo Braga (MDB-AM), no final de outubro. Ele definiu um limite para a carga tributária, propôs a expansão do Fundo de Desenvolvimento Regional em R$ 20 bilhões e sugeriu uma avaliação dos regimes especiais a cada cinco anos.

Novos impostos e sistemas adotados pela reforma tributária


O Brasil está em vias de implementar um sistema tributário reformulado. O país vai aderir ao modelo de Imposto sobre Valor Agregado (IVA), já em prática em mais de 100 nações.

De acordo com o senador Eduardo Braga (MDB-AM), relator do projeto, essa mudança visa simplificar procedimentos e diminuir a burocracia. Além de eliminar a incidência de impostos sobre impostos, que atualmente elevam o custo de produtos e serviços.

Na esfera federal, haverá a consolidação do IPI, PIS e Cofins na nova Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS). No âmbito estadual e municipal, o ICMS e o ISS serão absorvidos pelo novo Imposto sobre Bens e Serviços (IBS).

Este se aplicará exclusivamente no destino final do produto ou serviço. O propósito é pôr fim ao conflito tributário, ou “guerra fiscal”, entre estados.

Imposto seletivo para produtos e serviços nocivos

Além disso, será criado o Imposto Seletivo (IS), ou “imposto do pecado”. A ideia aqui é substituir o IPI. O IS funcionará como um desestimulo ao consumo de itens e serviços nocivos à saúde, como álcool e tabaco. Além disso, o IS visa a proteção ambiental e a redução de emissões de carbono.

O IS será aplicado especificamente sobre armas e munições (com exceção das destinadas à administração pública). E não incidirá sobre exportações, energia elétrica e serviços de telecomunicações.

Uma análise da Consultoria Legislativa do Senado aponta que as mudanças propostas vão além de uma simples renomeação de tributos. Espera-se que o IBS e a CBS abordem e resolvam alguns dos problemas mais complexos do sistema tributário nacional. Entre eles estão a questão da tributação “em cascata”, que implica em múltiplas cobranças de impostos ao longo das etapas de produção e venda de um produto.

Setores e produtos que se beneficiam da alíquota reduzida na nova reforma tributária


Em resumo, os seguintes itens e serviços terão isenções totais das contribuições para o CBS e o IBS:

  • Cesta Básica Nacional de Alimentos;
  • Hortaliças, frutas e ovos;
  • Serviços médicos, equipamentos médicos e de acessibilidade para deficientes;
  • Medicamentos;
  • Produtos para gestão da saúde menstrual;
  • Serviços oferecidos por Instituições Científicas, Tecnológicas e de Inovação (ICT) sem fins lucrativos;
  • Aquisição de veículos por taxistas e pessoas com deficiência ou autistas;
  • Compra de medicamentos e equipamentos médicos por órgãos governamentais e entidades sociais;
  • Projetos de revitalização em áreas históricas urbanas e de recuperação urbana.

Além disso, haverá uma diminuição de 60% nas contribuições para o CBS e o IBS para:

  • Serviços de transporte público coletivo urbano, semiurbano e metropolitano;
  • Alimentos para consumo humano;
  • Artigos de higiene e limpeza prioritários para famílias de baixa renda;
  • Produtos brutos agropecuários, aquícolas, pesqueiros, florestais e extrativos vegetais;
  • Matérias-primas agropecuárias e aquícolas;
  • Produções nacionais artísticas, culturais, de eventos, jornalísticas, audiovisuais, desportivas e de comunicação institucional;
  • Produtos e serviços essenciais à soberania e segurança nacionais, informação e segurança cibernética;
  • Uma versão ampliada da cesta básica.

O ProUni receberá isenção completa do CBS. Profissionais liberais, como aqueles em campos de trabalho intelectual, científico, literário ou artístico e sujeitos à regulamentação profissional, terão um desconto de 30% no CBS e no IBS. Essas medidas fiscais serão submetidas à revisão a cada cinco anos.

Cesta básica

O Ministério da Fazenda propôs uma nova estruturação tributária para o essencial da cesta de produtos dos brasileiros. Em suma, haverá uma divisão em duas categorias, para melhor atender às necessidades da população e combater a fome.

A cesta básica nacional, que contém itens essenciais para a subsistência, continuará com a alíquota de imposto zerada. O que reflete a preocupação do governo com as questões sociais e o acesso à alimentação.

Por outro lado, haverá a introdução de uma cesta básica estendida. Esta incluirá uma gama mais ampla de produtos com uma alíquota tributária reduzida a 40% da padrão.

Para tornar esses produtos mais acessíveis, haverá um sistema de cashback. Ou seja, uma devolução parcial do valor pago em impostos para os consumidores.

Regionalização da cesta básica

Além disso, está em discussão a regionalização da cesta básica nacional. Isso permitiria a adaptação do conteúdo às especificidades e necessidades alimentares de cada região do país. A definição dos itens regionais ocorrerá por meio de lei complementar.

Em um esforço para aliviar o fardo das despesas domésticas para as famílias de baixa renda, o governo também anunciou a medida de cashback para serviços essenciais como energia elétrica e gás de cozinha.

Esse reembolso de impostos será aplicado diretamente como um desconto nas contas de luz e na compra de botijões de gás. Isso deve proporcionar um alívio imediato nas finanças dessas famílias.

Para isso, uma lei complementar detalhará os procedimentos específicos para o ressarcimento e os critérios de elegibilidade para o cashback. O objetivo é garantir que o suporte financeiro chegue efetivamente a quem mais precisa.

Setor automotivo

O Congresso Nacional aprovou a prorrogação dos incentivos fiscais para montadoras de veículos nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste até o final de 2032.

No entanto, esses benefícios serão restritos aos projetos que receberem aprovação até o dia 31 de dezembro de 2024. A condição é de que tais incentivos não se expandam posteriormente.

Originalmente, o relatório apresentado no Senado propunha que apenas a produção de carros elétricos se beneficiasse. Contudo, após as emendas dos senadores Fabiano Contarato (PT-ES) e Carlos Viana (Podemos-MG), a vantagem fiscal se estende também às montadoras que produzem veículos movidos a biodiesel. E ainda aos modelos híbridos que operam tanto com biodiesel quanto com gasolina.

Esta inclusão dos veículos a biodiesel foi uma vitória para os produtores rurais, expandindo o mercado para o biocombustível. A expectativa é que uma lei complementar regule o benefício.

A ampliação desses incentivos desencadeou uma reação de última hora por parte dos governadores das regiões Sul e Sudeste. Além de críticas por parte das montadoras tradicionais. Esses grupos políticos argumentaram contra a extensão dos benefícios para tecnologias de combustíveis alternativos.

Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional

Outro ponto revelante é a criação do Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional (FNDR). O objetivo do FNDR é equilibrar o desenvolvimento econômico entre os estados brasileiros e compensar as perdas advindas do término da guerra fiscal.

Em resumo, este fundo ajudará estados que, ao não poderem mais oferecer incentivos fiscais para atrair negócios, enfrentariam desvantagens na captação de investimentos. O FNDR terá aportes financeiros da União e destinará recursos para uma variedade de iniciativas.

Por exemplo, incluem investimentos em estudos e construção de infraestrutura. Também inclui apoio a atividades produtivas com alto potencial de criação de empregos e renda, por meio de subvenções econômicas. E iniciativas em desenvolvimento científico, tecnológico e inovação.

Além disso, os projetos financiados pelo FNDR terão um olhar atento para a sustentabilidade. A prioridade será a preservação ambiental.

A distribuição dos recursos será progressiva pela União. Começa com R$ 8 bilhões em 2029 e aumenta anualmente até alcançar R$ 40 bilhões em 2034.

A partir desse ponto, a contribuição anual aumentará em R$ 2 bilhões, atingindo um total de R$ 60 bilhões em 2043. Para a alocação dos fundos, prevalecem os critérios do Fundo de Participação dos Estados (FPE). O FPE será responsável por direcionar 70% dos recursos do FNDR. A distribuição dos 30% restantes terá como base a população de cada estado.

Comitê Gestor

O Conselho Federativo, responsável pela gestão da cobrança e da arrecadação do Imposto sobre Bens e Serviços, passará por uma mudança significativa. Inclusive de nome, agora Comitê Gestor.

Em resumo, este órgão terá uma função estritamente técnica. O objetivo principal é garantir a distribuição adequada dos recursos provenientes da arrecadação. O comitê não terá poder para sugerir novas regulações legislativas.

Um novo procedimento será implementado para o presidente do Comitê Gestor. Esse profissional deverá passar por uma sabatina no Senado para assumir o cargo.

Ou seja, o Comitê fica em pé de igualdade com outras posições de alto nível na administração pública. Principalmente no que diz respeito à responsabilização e à transparência.

O Congresso Nacional terá a prerrogativa de convocar o presidente do Comitê para prestar esclarecimentos e solicitar informações. Assim como já acontece com os ministros de Estado. Essa medida visa fortalecer o controle e a supervisão das atividades do Comitê por parte do Legislativo.

Além disso, a representatividade do Comitê Gestor é uma preocupação. O grupo terá membros das carreiras da Administração Tributária e das Procuradorias dos estados, do Distrito Federal e dos municípios.

No entanto, uma emenda pretende evitar a criação de novas carreiras ou cargos específicos dentro do Comitê. A ideia é consolidar a composição atual e impedir expansões desnecessárias. A emenda foi uma solicitação dos Fiscos estaduais e municipais.

Fundo de Compensação

Outro ponto importante é a criação do Fundo de Compensação de Benefícios Fiscais. Trata-se de um modelo para assegurar, até o final de 2032, que as empresas que atualmente aproveitam isenções e benefícios fiscais do ICMS tenham compensações após a transição para o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS).

Essas isenções são tradicionalmente ofertas dos estados como parte de uma política para incentivar a atração de negócios e investimentos.

Adicionalmente, o texto legal recém-aprovado mantém a possibilidade de os municípios cobrarem a contribuição de iluminação pública. E introduz a opção para que criem taxas que financiem, expandam e aprimorem sistemas de monitoramento para garantir a segurança e a manutenção de espaços públicos.

Para financiar o fundo, a União se comprometeu a destinar recursos gradativamente crescentes de 2025 a 2029. Por isso, começa com R$ 8 bilhões em 2025 e alcança R$ 32 bilhões em 2028 e 2029.

Posteriormente, os aportes decrescem. E retornam a R$ 8 bilhões em 2032, como mostra esta escala:

  • R$ 8 bilhões em 2025;
  • R$ 16 bilhões em 2026;
  • R$ 24 bilhões em 2027;
  • R$ 32 bilhões em 2028 e 2029;
  • R$ 24 bilhões em 2030;
  • R$ 16 bilhões em 2031;
  • R$ 8 bilhões em 2032.

Travas na reforma tributária


Para garantir a estabilidade da carga tributária referente ao consumo no Brasil, estabeleceu-se um teto que atualmente corresponde a 12,5% do Produto Interno Bruto (PIB).

Com o objetivo de manter o alinhamento da tributação com a capacidade econômica do país, se definiu que a cada cinco anos, haverá uma revisão desse teto com base em uma fórmula específica. Essa fórmula levará em conta a receita média com impostos sobre consumo e serviços no período de 2012 a 2021.

O cálculo dessa fórmula se fará com a proporção entre a receita tributária média desses anos e o PIB. Ou seja, refletindo a totalidade dos bens e serviços produzidos no país. Se for constatado que o teto foi ultrapassado, será necessária uma redução na alíquota de referência dos impostos.

Essa potencial redução seria determinada pelo Tribunal de Contas da União (TCU), que usaria dados fornecidos tanto pelos estados e municípios quanto pelo futuro Comitê Gestor do Imposto sobre Serviços.

Essa medida garante que o ajuste das alíquotas seja feito de maneira transparente e baseada em informações concretas, assegurando uma contribuição tributária justa relacionada ao consumo.

Possível alíquota máxima na nova reforma tributária


O Plenário aprovou um texto que deixa em aberto a definição da alíquota máxima para o CBS e para o IBS, os quais não contam com isenções específicas.

Estes dois tributos serão criados através de lei complementar, sendo que a alíquota da CBS, de âmbito federal, poderá ser estabelecida por lei ordinária. Já a alíquota do IBS será fixada pelos próprios estados e municípios.

De acordo com uma estimativa realizada pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, a definição das alíquotas levou em consideração o volume expressivo de setores que gozam de isenções fiscais.

Diante da necessidade do governo em manter a sua receita fiscal sem prejuízos, a alíquota máxima sugerida é de 27,5%, que visa equilibrar as perdas advindas das isenções propostas na Proposta de Emenda à Constituição (PEC).